18 de janeiro de 2012

Instituto de Letras - UFRGS. O que é, como se faz

Nunca fui muito afeito aos bancos escolares. Ao contrário da já disseminada crença popular, acredito que a escola traz muito mais ignorância que conhecimento. A faculdade, apesar de gozar de um status mais respeitável no contexto do sistema educacional, também não é lá muito diferente. Não posso opinar sobre tudo, mas minha passagem por duas faculdades me permite dar alguns pitacos sobre o assunto.


No Jornalismo (que graças a deuz nunca cheguei a concluir), tive dezenas de disciplinas, como Redação Jornalística, Telemática e Videotexto, Introdução à Publicidade e Propaganda, mas todas elas poderiam ter o mesmo nome: Como Eliminar Qualquer Resquício de Ética e Vender Mais Jornais. Mas estou enrolando, pois eu queria mesmo era falar dos meus tempos na Faculdade de Letras da Urghs, a Universidade Federal dos Gaúchos.


Quando entrei lá, havia faixas informando que o curso de letras da urghs era "Nota A" de acordo com alguma avaliação governamental. Depois de alguns meses ali, fiquei imaginando assustado como seria um curso "Nota C", por exemplo.


As instalações
São ideais, se você adora se asfixiar num banheiro mais fétido e nojento que vômito de morto-vivo. De telhados que cedem com qualquer vento, convidando a chuva para formar rios pelos corredores, a equipamentos ultrapassados, não faltam exemplos do bom investimento do dinheiro público. Mas o melhor mesmo são as salas de aula. Com capacidade para não mais que vinte pessoas, algumas são socadas com 50 alunos, afinal há de se dar acesso a todos na universidade pública, gratuita e de qualidade. Para algumas disciplinas, você precisa de pelo menos um caderno, caneta, um xerox, e alguns dicionários. Sem falar num lugar a mais para seu casaco, bolsa, mochila, etc. Obviamente aqueles banquinhos duros com um pedaço de tábua não dão o suporte necessário para o seu material. Ainda mais que são inclinados e qualquer coisa que você coloque ali vai rolar e cair embaixo do banquinho de algum colega duas filas adiante. O RU, Restaurante Universitário, é outra preciosidade. Depois de ficar pelo menos 20 minutos na fila (constantemente aumentada à sua frente pelos diversos furões), você avista a fumaça fedorenta do local, infestado pelo cheiro de gordura podre e de detergente velho, mas aí já é tarde para desistir e você  vai até o fim. Se não comer carne, como é meu caso, talvez tenha sorte de se servir de arroz branco e alface. Isso se as inteligentíssimas e preparadas nutricionistas não tiverem colocado linguiça no arroz e bacon na alface. Mas as coisas estão melhorando. No século 21, a direção deu um passo muito ousado, enfrentando resistências, e substituiu os tradicionais toca-fitas, nos laboratórios de língua, por revolucionárias máquinas altamente complexas chamadas computadores. Uau.


O conteúdo
Fiz bacharelado em tradução, achando que o as disciplinas pudessem dar uma boa base para a prática dessa valorosa profissão. E então me surpreendo descobrindo que as cadeiras de tradução (apenas 4, entre os quase 300 créditos) só começam pela metade do curso e são relegadas a segundo plano, sendo ministradas por professores substitutos que nunca trabalham com isso e não escondem não ter ideia alguma do que estão fazendo ali. 
Como um bom curso de humanas, todo o "conhecimento" produzido ali dentro não serve para a vida real, sendo que seu principal propósito é apenas formar professores que vão formar professores que vão formar professores e assim por diante. Os alunos são filhotes de pássaros se alimentando de comida regurgitada e jamais pedem pra dar uma olhadinha no cardápio pra ver se tem outra coisa. 
Estudar teoria não é mais suficiente no mundo acadêmico. Melhor é estudar as teorias sobre as teorias. Como já escreveu alguém, "estudar teoria da tradução é tão útil para a prática tradutória quanto saber as leis da física para andar de bicicleta".


Os professores
Logo no primeiro semestre, os alunos têm o prazer de ter aulas com uma professora (J.Z.) com mais de 30 anos de experiência. Mas isso não impede que seja insegura, estressada, explosiva e com pouco domínio sobre a língua inglesa.Outra, uma das professoras de tradução mais conceituadas, tem a fama de fazer tudo o mais rápido possível (pensar pra quê?) pois a gente tem que "pagar o condomínio".
Já a única professora que tenta ir um pouco mais além, instigando os alunos a pensarem antes de traduzirem e refletirem sobre as peculiaridades da língua é tida como lenta demais, e virou piada nos corredores, ganhando o triste rótulo de  "Vó da Barbie".
Valdir disse uma vez: "O bom de ser funcionário
da Urghs é que a gente nunca vai ser demitido".
Os professores mais respeitados normalmente são péssimos seres humanos. Autoritários, rancorosos, grossos e burros, mas, segundo seus admiradores "sabem muito". Engraçado que nunca consegui descobrir sobre o que é que eles sabem muito. Ana Zandwais, um exemplo de tosquice, sabe muito, mesmo tendo afirmado que Salman Rushdie havia sido assassinado havia anos, ignorando evidência em contrário. No seu isolamento da vida real, também já declarou que a maioria da população brasileira conhece Shakespeare. Outros desses que "sabem muito", Valdir Flores e uma outra de Leitura e Produção Textual cujo nome felizmente já esqueci, também já deram em aula aqueles textos toscos de internet atribuídos a Luis Fernando Verissimo, inclusive em provas. Quando questionei a autoria, o luminar me disse "Claro que é do Verissimo, tá ali!", apontando a "assinatura" embaixo do texto.
Marcos Bagno, muito querido na Letras, escreve: a maioria do nosso professorado também se inclui naquele apavorante índice de analfabetismo funcional. Procurados hoje em dia pelos estudantes de origem mais humilde e de baixíssimo letramento, os cursos de licenciatura vão diplomando milhares de pessoas sem habilitações mínimas para exercer a profissão docente.

Ana Zandwais é irmã gêmea do Ace Frehley
Para confirmar isso, na época da minha formatura (a cuja cerimônia fiz questão de não comparecer) o povo estava escolhendo frases inspiradoras para o convite. Apareceram dezenas de poesias do Shakespeare e textos do Charles Chaplin cuja fonte era a confiabilíssima "internet". Quando apontei a incorreção da atribuição de autoria, ainda fui criticado pelos colegas, pois afinal como eles iriam saber? E ainda mais o google confirmou...
Enfim, acho que alguns tomam o nome do curso literalmente, e ficam satisfeitos ao conseguirem decorar todas as letras do alfabeto.





Os tipos
O Intelectual Pop.
Depois que entrei na Letras, descobri que muita gente tem o estudante desse curso em alta cotação. Digamos que, de pronto, o povo acha que o letroso é, antes de tudo, um intelectual, uma pessoa de alta cultura e literatura, afinado com a gramática e com domínio sobre a sua língua materna e outras estrangeiras, enfim, um mago da palavra escrita. Nada poderia estar mais longe da verdade. O estudante de letras tem o nível cultural baixíssimo, se é que se pode dizer que tem algum.  Essa imagem pode ter sido criada ao observarmos alguns tipos mais indie alternativos modernosos, rapazes com seus All Star vermelhos, blazers de veludo, cachecóis com nós complicados, e mocinhas que só compram em brechós da  Avenida João Pessoa, com suas saias de bolinha e chapéus esquisitos (que usam quando esquecem de lavar o cabelo no inverno). Os óculos de armação preta eles devem ter comprado todos no mesmo lugar. Com suas camisetas do Woody Allen e sua eterna pose de poetas malditos (cigarro é item obrigatório, claro) e de  garotas blasé de um filme do Godard, realmente não há como achar que não sejam gênios esperando florescer no meio underground. Quando se dão conta de que muitos IPs estão cursando letras, deixando tudo muito mainstream, eles abandonam a faculdade.



As Donas de Casa
Mas os IPs correspondem a menos de 10% do corpo discente. O grosso, a massa, são mesmo as Donas de Casa. Você as reconhece de longe. Vestem moletons velhos um número maior do que o ideal, calças jeans e tênis brancos. As Donas de Casa não têm idade, podendo ser jovens de 18 anos ou verdadeiras donas de casa. Elas têm muito orgulho de si mesmas apenas pelo fato de estarem cursando Letras. Choram ao lembrar de quando passaram no dificílimo vestibular. O maior objetivo da vida da Dona de Casa é ser professora, seja em colégio estadual ou mesmo na faculdade de letras. As Donas de Casa leem Paulo Coelho, Dan Brown,  livros espíritas e se irritam muito quando alguém questiona o valor literário das suas obras, afinal elas o fazem por diversão e também leem Clarice Lispector, Jorge Luis Borges e Fernando Pessoa (mas só aqueles textos autoajuda recebidos por email). Ao contrário dos Intelectuais Pop, as Donas de Casa levam muito a sério o curso, e jamais o abandonam, pois isso mataria seus pais de decepção. Como estão sempre comendo bolachas recheadas ou pães de queijo recheados ou qualquer outra coisa recheada, elas dobram de peso depois de dois anos e depois se mantêm como estiverem até o fim. Lembram um pouco a abnegação religiosa e o sacrifício católico, como se algum prêmio as esperasse no além. Parecem esquecer que atual diretora do Instituto já foi Miss Porto Alegre. 

O povo da Letras é muito divertido


O pessoal do Inglês
É a maioria.
 Não fede e nem cheira (ou melhor, alguns cheiram muito mal), mas passam despercebidos. Entram, recebem seu diploma e saem sem ter feito nada marcante durante todos os anos de curso.


O pessoal do francês.
São moças na maioria. Muitas são Intelectuais Pop. Só o fato  de falarem francês aumenta seus QIs em 50 pontos e também seu sex appeal.

O pessoal do espanhol.

Composto em sua maioria por Donas de Casa. Acreditam piamente que ninguém consegue entender espanhol se não tiver cursado Letras por no mínimo quatro anos. Para comprovar isso, citam meia dúzia de falsos cognatos (sempre os mesmos, como "embarazada" ou "un rato") e  seguem firmes na sua convicção de que estão decifrando os mistérios de uma dificílima e exótica língua. Mesmo que seja quase igual ao português.


O pessoal do russo.
Ouvem black metal. Se vestem de preto. 
São poucos.  Ainda bem.


O pessoal do japonês.
É uma turma divertida. Em sua imensa maioria são fãs de mangá e anime. Usam cosplay em sala de aula. Alguns são carecas.


O pessoal do alemão
O que dizer de alguém que gosta de uma língua cujos falantes parecem estar cuspindo pregos antes de enviar pessoas pro forno?

O pessoal do italiano
Quase esqueci do pessoal do Italiano. Por que será?





A repercussão deste post pode ser lida aqui:

19 comentários:

  1. Pessoal do italiano é só o Doutor. Lembro que tinha uma cadeira de italiano que era só ele e o professor. Ou seja, os dois saíam pra fumar (cada um com seu tipo de fumo), os dois voltavam, os dois podiam até combinar de matar aula quando algum compromisso externo o exigisse.

    Há algo de estúpido nisso. Os caras vao lá (muitos) pra pegar as famosas gatas do IL (que existem até o segundo semestre, antes de se destruírem ou trocarem de curso). Por que não fazer italiano e aumentar as chances com uma língua que muitas delas consideram sexy? Bom, porque daí ficaria claro o motivo de sua escolha de curso. E ninguém lá pode admitir um motivo tão banal (?!) quanto sexo para cursar o MELHOR CURSO DO MUNDO.

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  2. Este é o retrato mais fiel do curso de letras da úrguizzzz. (arghhh). Eu me vi retratada no pessoal do inglês que não fede, nem cheira. Eu não cheirava mal, não,mas saí sem deixar marcas e com uma visão muito parecida com a sua do curso onde há a maior concentração de eruditos e uns outros pobres mortais que estão lá só para que os "eruditos" possam sentir-se verdadeiros detentores do conhecimento.
    A propósito, acho que enxerguei nitidamente a figura que não cheira, digamos,tão bem assim. (kkkkk)

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  3. Ainda assim, devo dizer que valeu a pena, pois conheci pessoas muito legais lá dentro. Trabalhei como bolsista em outras áreas e descobri que a ufrgs é muito mais que o curso de letras, ainda bem! Foi difícil suportar, mas eu consegui!

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  4. Hmm, e agora, será que o teu fedorento é o mesmo que o meu?

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  5. dos seus textos sempre gostei. parabéns.

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  6. Obrigado, mãe, sei que sempre posso contar com seu apoio.

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  7. Olha, eu acho que o curso de Letras é lindo (literatura e língua, o que pode ser melhor?). Realmente é chato ter aula com os mestrandos, que sabem tanto quanto os próprios alunos a quem estão lecionando. However, muitos dos professores titulares são efetivamente excelentes, pelo menos os que eu tive o prazer de conhecer, e pouco me importa se são ou não pessoas horríveis fora da sala de aula, como afirmaste. Falta mesmo um pouco de pé no chão, principalmente na licenciatura, o que se aprende ali não é aplicável no mundo real. Mas falar da professora Ana Zandwais... Cara, a mulher pode ter falado uma bobagem ou duas, mas ela é genial, posso afirmar. Ela foi minha orientadora de TCC e os comentários, a complexidade das análises e a memória dela são impressionantes, ainda mais para uma senhora daquela idade. Ela é extraordinária na Análise do Discurso, um fenômeno. E de uma pessoa assim pode-se tolerar (e até esperar) uma bizarrice ou outra. Enfim, é só uma opinião... Já que tens o direito de esculhembar o curso, os professores e o pior de tudo - os colegas -, me sinto no direito de dizer o que penso também. Um grande abraço, G.

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  8. Fico impressionado que haja pessoas no mundo capazes de defender a Ana Zandwais. Esta mulher é mentirosa e canalha, e, sim, péssima professora e profissional incompetente. Se eu tivesse que demitir apenas um professor do IL, não pensaria duas vezes: seria ela. Disse e repito: um dos piores seres humanos com quem já tive o desprazer de cruzar na minha vida.

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  9. Respeito tua opinião a respeito da (in)competência da professora Ana Zandwais, apesar de discordar radicalmente. Gostaria de saber, entretanto, on what grounds tu te baseias para chamá-la de "mentirosa e canalha", e afirmar tão veementemente que ela foi "um dos piores seres humanos" com quem tiveste o desprazer de cruzar na tua vida.

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  10. Anônimo, que pede para que eu exponha os podres da Zandwais. Quem sou eu pra destruir tuas ilusões? Prefiro te deixar no conforto da tua ignorância.

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  11. A Ana Zandwais tem só 54 anos. (Tá, realmente parece muito mais) hahahaa

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  12. Anônimo, jamais imaginaria que A.Z. era tão pouco velha. Péssima notícia, significa que ela ainda vai demorar pra se aposentar...

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  13. Chateada, esse post e comentários meio que acabaram com as minhas ilusões de fazer Letras na UFRGS. É realmente tão ruim assim? Eu queria fazer bacharelado. Eu estou a ponto de me mudar pra fazer Letras por aí. Moro em Cuiabá e o curso daqui vai ser suspenso pela nota que obteve no ENADE. Porto Alegre é o único lugar em que eu posso morar, pois tenho família por aí.

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  14. Olá Vitória.
    As pessoas me diziam: "Não leia Irvin Yalom", "jamais leia Irvin Yalom", "seus livros são horríveis". Mas a experiência dos outros não pode substituir a minha própria. Então fui lá e li Irvin Yalom. Dois livros dele. E adivinha? Eram muito ruins mesmo. Só que ele também é um best-seller, e milhares de pessoas o idolatram, fazer o quê, as pessoas são diferentes.
    Então, meu anjo, vai lá e depois me diz o que achou, pois ficar em Cuiabá não dá!

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  15. Tu é um burro, rapaz! kkkkk

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  16. Usar o Caetano Veloso para chamar alguém de burro é o tipo de argumentação própria de descerebrados da Letras. Quem sabe, você, anônimo covarde (se não fosse covarde não seria anônimo), deixa a preguiça de lado e rebate algum ponto do texto com argumentação de verdade?

    Ah, peraí. Agora que vi que você riu "kkkkk". E eu perdendo meu tempo com você...

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