Milhares de pessoas estranharam a minha prolongada ausência da rede social
The Facebook e da internet em geral. Por isso resolvi agora tornar claro o motivo do meu sumiço, até porque pode haver pessoas com o mesmo problema que eu tive, e seria bom ajudá-las. No depoimento abaixo arrisco minha reputação pública, mas unicamente pois pode haver pessoas com o mesmo problema que eu tive, e se encontrarem força nas minhas palavras, é isso que importa pra mim.
Serei direto. A verdade, amigos e amigas, é que eu havia me tornado um...
Natureba.
Quem me conhece acompanhou de perto esse infeliz declínio. Tudo começou quando parei de comer
carne, e depois ovos e laticínios. Logo comecei a andar com outros
veganos. Esses veganos me apresentaram a soja, primeiramente como shoyu e tofu e depois em outras formas, como hambúrguer, kibes e a famigerada PVT (proteína vegetal texturizada). Achei aquilo tudo muito inocente e divertido, e continuei utilizando sem problema, apenas como um mero substituto da carne. Mas, meus amigos, todos sabemos que a
soja é a porta de entrada para outras naturebices.
Entrei em uma Ong vegetariana e lá descobri que havia um outro mundo além da soja. Troquei o arroz branco por integral, o feijão por grão-de-bico, a batata frita por salada de rúcula com tomate seco. Na época, eu ignorava os sinais de reprovação que as pessoas mais próximas me davam. Amigos me evitavam, familiares tentavam me dissuadir daquela opção alimentar, alertando para um possível caminho sem volta. Eu ignorava cada alerta, e nos churrascos de família eu envergonhava a todos devorando sem pudor pratos e pratos de
salada.
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Isso foi meu almoço por muito tempo |
Esse declínio foi muito rápido, e quando vi meu círculo social já era formado todo por
naturebas. Com eles aprendi que a soja já era um alimento manjado, e me apresentaram ingredientes muito mais naturebas, que consumia sem parar: grãos de amaranto, sementes de girassol, óleo de chia, farinha de maca, suco de mirtilo. Restaurantes vegetarianos já não me bastavam, eu precisava de mais. Me tornei conhecido nas banquinhas de produtos naturais do
Mercado Público e passei a frequentar regularmente a infame "feirinha ecológica do bom fim", uma espécie de crackolândia, só que do Mal. Lá todos os produtos eram orgânicos e sustentáveis, cultivados por pequenas famílias de produtores. (A polícia, mesmo sabendo o que ocorre ali, pelas várias reportagens na TV com câmera escondida, nada faz, e deixa os transeuntes circularem em plena luz do dia carregando suas sacolas de pano contendo sabemos bem o quê)
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Conhecido ponto de venda de orgânicos |
A essa altura, embora eu tentasse negar a todos, dizendo que eu poderia parar quando eu quisesse, eu já era inegavelmente um natureba: troquei meu all-star vermelho por sandálias, meus jeans pretos por uma bombacha de algodão branca e minha camiseta do iron man por uma bata colorida que mandei trazer da Índia. Meus colares de sementes, meu bigode sujo de leite de castanhas e o odor corporal também não escondiam meu aspecto natureba. Em casa, com um incenso aceso, comecei a praticar meditação e onanismo tântrico, sempre invadido por muita
luz e
harmonia. Mas nem tudo era paz, certa vez entrei em uma discussão sobre a pronúncia correta da palavra "quinoa", que eu chamava de "quinua". Esse abominável estilo de vida também trazia outras consequências desastrosas: perdi peso rápido e a qualidade do meu sono melhorou muito, acabando com minha insônia, e confesso que até exercícios passei a praticar, além de yoga,
slack line e dos malabares, atividades obrigatórias de todo bom natureba.
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A imagem é forte, mas espero que sirva de alerta para jovens |
Um domingo eu estava assistindo a um grupo de tambores no parque
Redenção quando ouvi um burburinho sobre uma novidade no mercado natureba. Quis saber o que era, me puxaram para um canto e me mostraram uma frutinha vermelha meio ovalada que eu jamais tinha visto: goji berry. "Qual é o barato?", perguntei já ansioso. "Velho, essa parada fortalece o sistema imunológico, previne catarata, protege o fígado e ainda retarda o envelhecimento e tem vitamina C pra caralho. O bagulho é sinistro, é o alimento completo! Já é usado no Tibete faz dois mil anos!" Perguntei: "Quanto é o grama?", e comprei 2kg. Peguei minha bicicleta barra forte e fui voando pra casa. Coloquei no multiprocessador um saco de goji berry, gengibre, espinafre, broto de alfafa, maçã, alecrim, capim-limão, semente de girassol, bergamota, agrião, cardamomo e fiz um creme espesso, de coloração marrom. Tomei tudo de uma vez só e corri pro Gasômetro bem a tempo de aplaudir o pôr-do-sol.
Fui encontrado dois dias depois, em transe absoluto, totalmente conectado com meu ser e a
Mãe Terra, entoando mantras ininterruptamente. Graças à nova lei de internação compulsória, minha família me levou a força para uma conhecida
Clínica de Intoxicação. E foi lá que estive todo esse tempo em que fiquei fora do
Facebook. Na Clínica de Intoxicação conheci muita gente com o mesmo problema que eu, e encontrei forças para largar o naturebismo. O tratamento é radical. No café da manhã são servidos apenas coca-cola, negresco e doritos. Logo
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Goji berry, minha perdição |
depois fumamos
Marlboro e bebemos cerveja até o meio dia, quando servem fanta laranja, pizza quatro queijos, batata frita e cachorro quente. De sobremesa temos ambrosia, torta de limão e sorvete de doce de leite. Ao longo do dia, de hora em hora, recebemos um suprimento de 100g de chocolate. À noite, há sempre uma festa regada a vodka, whiskey, maconha e pó. No começo não foi fácil, e eu vomitava tudo, mas depois desse tempo todo internado já posso dizer que sou outra pessoa: engordei quase 10kg, minha insônia voltou e já doei minhas antigas roupas para a campanha do agasalho.
Se você conhece alguém que esteja passando pelo mesmo Mal, não espere pelo pior, por favor leve-o a uma
Clínica de Intoxicação antes que seja tarde demais.
Conto com a compreensão e o apoio dos amigos para continuar assim, seguindo sempre, claro, um dia de cada vez.
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Festinha de despedida na Clínica de Intoxicação |
Agradeço o compartilhamento, serviço de utilidade pública de primeira necessidade. Sabemos o quanto o problema é sério e pode nos guiar a um fim catastrófico, como nos rememora o seguinte relato:
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