9 de dezembro de 2015

Eu sei o que você comprou no verão passado.

Cansei de ouvir coisas como "Ah mas o meu celular Nokia 1100 ainda funciona, por que eu iria trocar?" Ou então "Minha televisão de tubo tem uma imagem ótima pra assistir DVD, o que eu quero com tela plana e blu-ray?". Chega de desculpinhas!

Você reclama que aparelhos eletrônicos são muito caros, que se fossem mais baratos compraria bem mais, mas vamos ser honestos: você e eu sabemos que, com o dinheiro que você gasta todo ano com livros, poderia comprar os mais modernos aparelhos eletrônicos do mercado. Essa desculpa esfarrapada não cola mais, você não engana ninguém. Eu vi você na Livraria Cultura com uma cesta cheia de livros, todo felizão, e nem consultou o preço antes de ir pro caixa. Você não consegue ler uma boa crítica literária num suplemento cultural sem domar a vontade de correr para a internet e encomendar aquele lançamento. Sai o novo do Ian McEwan e você já garante o seu na pré-venda, só para lê-lo antes de todos os seus amigos. Ou, pior ainda, viaja para o exterior e volta com a mala abarrotada de livros que ainda nem foram traduzidos no Brasil, mesmo com o risco de ser pego na alfândega.

Dados da Câmara Brasileira do Celular dão conta de que, no último ano, o percentual de brasileiros que compraram celulares novos despencou de 30% para 18%. Números da Fundação Getulio Vargas também apontam queda vertiginosa na quantidade de aparelhos eletrônicos consumidos no país, o que acarretou em fechamento de empresas e demissões de milhares de funcionários. Ao mesmo tempo, o mercado editorial atravessa sua melhor fase neste século, com faturamento 15,6% maior que o do ano passado. Pesquisa do IBGE corrobora esses dados, mostrando que o brasileiro lê, em média, 13,8 livros por ano.

Aí você ainda tem a cara de pau de dizer que não compra celular por causa da crise? Que não tem dinheiro sobrando? Claro que não sobra, se você gasta todo seu salário com livros.

Linha de produção da Schwarcz
Mas eu compreendo. Talvez você compre tantos livros somente porque desconhece o que de fato acontece na cadeia de produção editorial. Em vez de dar dinheiro para modestas companhias produtoras de tablets, prefere financiar editoras milionárias. Você deve ignorar que, para que os livros cheguem em suas mãos, eles passam antes por tradutores, revisores, bibliotecárias e diagramadores que são explorados em países como Malásia, Vietnam, Indonésia e, claro, China, onde  revisores em linha de produção trabalham em turnos de 15 horas, sete dias por semana, em clara violação a leis trabalhistas. É conhecida a história  de escravos chineses que deixam recados para os leitores escondidos em livros, como este, em letras miúdas dizendo
"Esta obra foi composta em garamond
e impressa em off-set  por favor ajude
sou o diagramador Zhang Li não durmo
há três dias por favor contate direitos
humanos em papel pólen soft 75g
em editora de Shenyang".

Em fábricas da Apple ou da HP, por exemplo, esse tipo de coisa não acontece. Vá agora mesmo na sua estante e faça um teste: pegue o primeiro livro e abra na última página.  Aposto que está escrito Made in China, acertei?
Refeitório da Cosac Naify


Mas, apesar de tudo, sou um otimista, e acredito que em breve o povo se conscientizará e finalmente deixará de comprar tantos livros, sobrando dinheiro para smart phones, iPads, tablets etc., afinal, amigo, você e o iPhone 6 nasceram um para o outro.




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