29 de julho de 2010

Diferenças Regionais

Como já foi constatado em pesquisas anteriores, o leitor do SMUB é um viajante contumaz. Por isso, divido um pouco da minha vasta experiência de viajante trazendo em primeira mão trechos do meu mais novo livro que nunca publicarei, "Meu Brasil Brasileiro - Guia do viajante brasileiro viajando pelo Brasil".


Para quem viaja, é sempre bom saber onde está pisando. É importante conhecer um pouquinho das peculiaridades locais antes de se meter em alguma encrenca ou cometer uma gafe terrível. Na verdade, a ignorância sobre a cultura local pode lhe custar a vida, ou, pior ainda, um desarranjo intestinal. No tópico seguinte abordaremos o deslocamento a pé do turista e suas implicações.


Tomemos Porto Alegre, por exemplo. Chegando lá, é melhor que o visitante saiba que os carros NÃO param para pedestres na faixa de segurança. Pelo contrário, estudos mostram que 70% dos motoristas aceleram ou mantêm a velocidade quando avistam alguém atravessando a rua. Atravessar a rua pode ser uma tarefa ingrata na capital dos gaúchos. Mesmo onde há semáforo* não é tão seguro, então conte pelo menos dez segundos após a luz ficar vermelha para poder atravessar. O turista deve saber que a luz amarela, ao contrário do resto do país, não significa ATENÇÃO, mas ACELERE-UM-POUCO-MAIS-QUE-VOCÊ-CONSEGUE-PASSAR-ANTES-DE-O-SINAL*-FICAR-VERMELHO. Por isso, tome cuidado.


em Florianópolis, o transeunte deve se manter pelo menos uns dois metros afastado do meio-fio da calçada. O problema é que, se você estiver passeando e de repente se aproximar demais da rua, os motoristas podem pensar que você quer atravessar e vão parar imediatamente, gerando um caos no trânsito. Lá todo condutor de veículo para para [acento diferencial, cadê você meu filho?!] o pedestre, inclusive motoboys, acredite!




Em Curitiba (subindo um pouco mais pela Região Sul), o motorista não toma conhecimento do turista, então não vai parar o carro na faixa mas também não vai atropelá-lo. Não se assuste, na gloriosa capital do Paraná o forasteiro é simplesmente ignorado. Mas não devemos logo pensar numa suposta falta de simpatia ou cortesia do povo de lá. É apenas o jeitão do curitibano. Como se sabe, ele é, em geral, um sujeito reservado, que prefere manter distância de quem vem de fora – de preferência uns 500km, mais ou menos.


Em São Paulo, o visitante se depara com um povo hospitaleiro nas ruas. Qualquer um que você encontrar estará disposto a lhe dar informações e ajudar a encontrar o endereço que você procura. O único detalhe desagradável é que a informação estará sempre errada. Isso se deve, em parte, a uma curiosa característica da maior cidade do Brazil: segundo o último Censo, apenas 12,37% da população de São Paulo é composta por paulistanos** [ em uma projeção do IBGE para daqui a 50 anos, só vai sobrar a família Maluf como legítima representante da cidade.] Mesmo assim, se você perguntar algo para um nativo, as chances de conseguir uma informação que preste são mínimas, pois o paulistano típico conhece apenas os caminhos de casa-trabalho-shopping-casa. Mas sobre a Rua Augusta você pode perguntar pois todo mundo sabe onde fica.

Outra peculiaridade é o orgulho que os paulistanos têm dos engarrafamentos-monstro, como se isso fosse uma característica típica de grande metrópole avançada e cosmopolita. Isso não passa, claro, da velha filosofia pobre conformista do "se não pode vencê-los, junte-se a eles".


Salvador (também conhecida como Salvadô)

As ruas são estreitas, as calçadas são estreitas, e a paciência dos motoristas é mais estreita ainda. Não se guie pelo seu preconceito, presumindo que os conterrâneos de Jorge Amado e Dorival Caymmi são sujeitos lentos e sem pressa. Podem até ser, mas essa malemolência que se vê na música e na literatura não os acompanha quando entram num carro. Os motoristas de Salvador esperam exatamente 0,2 segundo para buzinar 4 vezes para o carro da frente quando o sinal abre, ou quando reduz a velocidade, ou por qualquer outro motivo que lhe der na cabeça. E as buzinadas têm um padrão: são sempre duas curtas seguidas, tipo bip-bip---bip-bip (ou dois i no Código Morse). Como os carros nunca param, os pedestres não existem, lhe restando duas alternativas: ou você é motorista ou passageiro de ônibus.


*ou sinaleira, sinal, farol, dependendo das diferenças regionais


- O rio de janeiro infelizmente ainda não conheço. Então se alguém quiser me pagar uma passagem e estadia na dita cidade meravigliosa, aceitarei de bom grado.


2 comentários:

  1. Heheheheh
    muito boa....

    sobre a viagem, nada a ver, agora ja compensei, tudo vale a pena!!!!!

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  2. Este post foi morbidamente profético. Escrevi: "saiba que os carros NÃO param para pedestres na faixa de segurança. Pelo contrário,". Poucos dias depois desta postagem, uma manchete na capa do jornal anunciava o 1000º morto no estado este ano: um pedestre atropelado na faixa de segurança em Porto Alegre.

    http://zerohora.clicrbs.com.br/zerohora/jsp/default.jsp?uf=1&local=1&section=Geral&newsID=a3004391.xml

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