Uma das coisas que mais gosto dos editores de texto eletrônicos, seja no computador ou celular, é a ferramenta dicionário. Não, não se trata de um acesso rápido às definições das palavras, o dicionário nesse caso é apenas a inscrição daquela palavra no banco de dados do editor. Sabe quando escrevemos no Word uma palavra que existe e ele a sublinha em vermelho, e ainda sugere uma outra? Pois é isso. Como eu dizia, eu gosto desse tipo de ferramenta pois, cada vez que incluo uma palavra nova no dicionário, eu sinto que meu Word ficou mais qualificado, mais completo. Word é que nem cachorro: nenhum é igual a outro, e alguns são mais inteligentes que outros, dependendo do tratamento que seu dono dá.
Por isso fiquei chateado quando troquei de PC recentemente, e fiquei com um Word zerinho, ou melhor, zerado. É um teste de paciência, pois é como se tivesse que ensinar o beabá a um Nobel de Literatura. Além de burrinho, meu novo Word é limitado, preconceituoso e puritano. Vejamos alguns exemplos.
Ele não reconhece algumas das minhas comidas preferidas. Adoro comida mexicana: tutela e Barreto com chalé: tortilla e burrito com chili. Segundo ele, também não resisto a uma bauxita (bruschetta). Para acompanhar, nada melhor que beber um chalé (shake). Ele simplesmente não aceita a invasão de empréstimos lexicais que vieram para ficar.
Meu Word também não é muito chegado a palavrões e obscenidades. A inocente bunda vira banda. Merda é meada. Puta é pauta. Para caralho ele sugere carlão ou carvalho. Em vez de boceta ele prefere bauxita, boceja ou bonita. Puteiro é fiteiro. Me irrito e digo que bosta, foda-se; ele me corrige: que basta, Fonda. Assim não dá...
Em alguns casos suas correções até divertem. Escrevo soutien por baixo da blusa e ele responde malicioso: soltem por baixo da blusa. Digo: Bin Laden o terrorista, e ele praticamente dá voz de prisão: Bem Lacem o terrorista!
Mas na verdade eu perdoo isso tudo. O que me indigna mesmo é ele não conhecer grandes escritores e ignorar clássicos da literatura mundial. Por exemplo, ele nunca ouviu falar em Saramago, mas em Jaramago sim. O coitado do Daniel Defoe virou Daniel Defeque. Ele não aprecia o Bukowski, e sugere a leitura de um obscuro Murkowski. Com o brasileiro Raduan Nassar ele tenta fazer poesia: Radiam Nascer. Meu amigo pessoal Contardo Calligaris é, segundo meu Word, Contado Calejares. Ele até conhece Nabokov e Shakespeare, que escreveram, respectivamente, Luneta e Rei Lair. Em compensação, ele sabe quem escreveu O Morro dos Ventos Oitantes e Incidente em Aditares. Se quiser fazer uma consulta gramatical, não encontro o Evanildo Bechara, então ele sugere a sua irmã: Ivanilde. Também não adianta consultar o Houaiss, só o Coais.
Haja paciência para educá-lo...
Abaixo coloco alguns outros exemplos:
Edgar Allan Poe - Hallan COE -
Gail Carson Levine - Galé Cartum Levine
Rilke – Relai
Mishima – Mechem
Paul Auster – Paul Abster
Millôr – Melar
Sommerset Maugham - Sommerset Magoam
Coetzee – Cotizei
Galeano –Galeno
Conrad – Conrado
Moliére – Moleira
Thoreau – Torino
Orwell – Orfeu
Kazuo Ishiguro - Kazuo Exíguo
Nenhum comentário:
Postar um comentário